A espiritualidade é um aspecto humano presente em todas as culturas, e ao longo dessa história, as diversas religiosidades buscam na natureza as respostas para anseios e dilemas da vida.
Dentre essas percepções de mundo, temos essa relação de forma mais estreita entre os povos indígenas e outras comunidades tradicionais, utilizando-se dos espaços naturais para culto de suas crenças. No Brasil, a bióloga e pesquisadora Érika Fernandes Pinto é uma referência nesse assunto, seu trabalho é de extrema relevância para a difusão e preservação, não só da natureza, mas de toda cultura que nela habita.
Em seu estudo “Sítios naturais sagrados: valores ancestrais e novos desafios para as políticas de proteção da natureza” (2017), são definidos como Sítios Naturais Sagrados (SNS): áreas de terra ou água que têm um significado espiritual único para povos e comunidades. Eles são consagrados em práticas ancestrais e comuns em todo o mundo, atribuindo-lhes valores simbólicos envoltos em mistério, maldições, magias ou milagres.
Muitas vezes, esses sítios são parte fundamental dos territórios dos grupos sociais e também atuam como refúgios de biodiversidade. Vários elementos da natureza, como montanhas, vulcões, rios, lagos, bosques, cavernas e ilhas, podem ser considerados lugares sagrados, e as razões para essa condição podem ser diversas.
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Os motivos que levam a surgir um SNS são variados, porém, geralmente essas áreas são interpretadas como locais de morada de divindades e espíritos ancestrais, possuem uma energia singular, podem estar relacionadas a alinhamentos astronômicos e fenômenos sazonais, e serem fontes de recursos especiais, como plantas medicinais e águas sagradas.
Esses sítios são visitados em ocasiões especiais para cerimônias ou rituais e são frequentemente objeto de proteção voluntária pelos grupos sociais relacionados a eles há muitos anos. A proteção desses locais muitas vezes implica em regras de acesso, restrições à ocupação de determinadas áreas e limitações no uso dos seus recursos naturais.
O valor da biodiversidade nos sítios naturais sagrados é elevado, pois podem conter uma riqueza biológica superior a reservas florestais ou outras áreas protegidas situadas no seu entorno, abrigando animais e plantas raras ou ameaçadas de extinção. Isso porque com a ação espontânea da população de resguardar esses locais, que muitas vezes ficam dentro de áreas degradadas ou de alto impacto ambiental, cria-se um refúgio para os seres.
Muitas das cavidades naturais no Brasil, algumas despertam magia para uns e medo para outros, são exemplos de lugares sagrados, sendo reverenciadas e temidas pela população local. Esses exercem fascínio na percepção e imaginação humanas.
Nos estudos de Érika foram identificadas 116 cavidades naturais com significação religiosa no Brasil, dentre grutas, lapas, furnas, dolinas, abrigos sob rocha, buracos e tocas, sendo várias delas ligadas ao culto católico. Vamos conhecer algumas delas:
Gruta do Santuário de Bom Jesus da Lapa/BA
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Sua história remonta ao período colonial (1691), que começa depois que o monge Francisco, vivendo em sofrimento, decide viver para a caridade, reivindicando de seus bens e sempre carregando uma cruz. Ao encontrar a gruta, lá deixa sua cruz. Para além da questão religiosa, a caverna abriga diversos espeleotemas e as rochas originais foram preservadas.
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O santuário conta com um elevado número de capelas, distribuídas em diferentes salões da caverna, e ainda diversos condutos foram transformados em locais de oferendas e votos. Ao longo do ano, são cerca de 2 milhões de visitantes no espaço. Você pode conhecer mais sobre o Santuário do Bom Jesus da Lapa em seu site oficial: https://www.centraldalapa.com/santuario-do-bom-jesus-da-lapa/.
Gruta da Mangabeira/BA
A caverna, também chamada de Gruta do Sagrado Coração de Jesus, recebe muitos romeiros vindos de peregrinações que iniciaram pela história de um vaqueiro que caiu em seu interior através de um buraco, interligando a superfície até seu fundo sem nenhum ferimento. Além da cultura que ela carrega, existem muitos espeleotemas a serem observados lá!
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Essa Lapa possui infraestrutura de apoio à visitação, recebendo visitantes ao longo de todo o ano, além da época das romarias, quando recebe um grande fluxo de visitantes. São cerca de 200 mil pessoas durante o ano.
Gruta das Encantadas/PR
Além da relação com o catolicismo, há cavidades ligadas a outras histórias e lendas, como a Gruta das Encantadas na Ilha do Mel, relata-se que naquele lugar havia sereias e outros seres mitológicos.
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Caverna do Diabo/SP
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Quando o assunto é caverna, temos o outro lado da história, quando elas são vinculadas a seres malignos, monstros e histórias sombrias, provocando mistério e medo na população do entorno. Um exemplo é a Caverna do Diabo, localizada no estado de São Paulo.
Hoje essa caverna possui uma completa infraestrutura de apoio à visitação turística, situada dentro do Parque Estadual da Caverna do Diabo, localizado no município de Eldorado. Há registros de visitação de cerca de 670 pessoas por dia nessa gruta.
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Em muitos casos, a implantação de infraestruturas para as cerimônias religiosas, de modo permanente – causaram significativa descaracterização especialmente das zonas de entrada das principais cavernas. Isso ocorreu visando acomodar com maior segurança e conforto os romeiros e visitantes, especialmente nas datas comemorativas do padroeiro de cada local, quando o fluxo de visitantes passa de milhares ao dia.
Há poucos estudos sobre o nível de impacto dessas alterações, inclusive das grandes aglomerações de pessoas sobre a fauna e o clima dessas cavidades. Grande parte dessas alterações foram efetuadas muito antes de existir qualquer tipo de instrumento legal de proteção ou ordenamento, buscando valorizar e permitir o uso religioso daquele templo natural.
Hoje, com base na legislação atual, a alteração e implantação de infraestruturas em cavernas, mesmo com finalidade religiosa, são passíveis de análise e licenciamento pelos órgãos competentes, conforme previsto na Resolução CONAMA nº 347/2004.
A proteção desses ecossistemas é garantia de vida em todas as suas dimensões, além de preservar o valor imaterial dessas relações culturais e religiosas.
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